7 de março de 2015

Objetos Cortantes - Gillian Flynn

Autora: Gillian Flynn
Editora: Intrínseca
Gênero: Drama/Thriller Psicológico
Número de Páginas: 256 páginas
Número de Estrelas: 4 estrelas
Skoob: Objetos Cortantes
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Recém-saída de um hospital psiquiátrico, onde foi internada para tratar a tendência à automutilação que deixou seu corpo todo marcado, a repórter de um jornal sem prestígio em Chicago (EUA), Camille Preaker, tem um novo desafio pela frente. Frank Curry, o editor-chefe da publicação, pede que ela retorne à cidade onde nasceu para cobrir o caso de uma menina assassinada e outra misteriosamente desaparecida.  Desde que deixou a pequena Wind Gap, no Missouri (EUA), oito anos antes, Camille quase não falou com a mãe neurótica, o padrasto e a meia-irmã, praticamente uma desconhecida. Mas, sem recursos para se hospedar na cidade, é obrigada a ficar na casa da família e lidar com todas as reminiscências de seu passado.  Entrevistando velhos conhecidos e recém-chegados a fim de aprofundar as investigações e elaborar sua matéria, a jornalista relembra a infância e a adolescência conturbadas e aos poucos desvenda os segredos de sua família, quase tão macabros quanto as cicatrizes sob suas roupas.


Até onde você acha que nossa criação nos intoxica? Será que aprendemos mais com os conselhos ou com os exemplos de nossos pais? O que uma pessoa pode fazer para se ter amor nessa vida? Quão pesada se torna a morte de uma criança numa família, numa cidade?

Enquanto Garota Exemplar me apanhou pelo cabelo, me sentou num banco de pedra fria, esbofeteou minha cara e disse “agora eu vou mudar seus conceitos sobre isso, isso e isso para sempre”, Objetos Cortantes não foi tão bem sucedido assim. O thriller psicológico que me atraiu pelo nome e pela autora, funcionou em alguns aspectos, impressionou em outros, mas é o tipo de livro que ou você gosta ou você não gosta mesmo.
“Por quanto tempo teremos sua companhia, querida?”, ela diria. Significando: “Quando você vai embora?”
O livro tem sua história acompanhando dois segmentos: as investigações (pois Camille se mete no meio das investigações policiais) sobre o assassinato de Ann Nash e o desaparecimento de Natalie Keene; e o drama da família Crellin (sua antiga família). Vamos analisar esses segmentos separadamente, começando pela família:

A família Crellin, formada por Adora (mãe de Camille), Alan (padrasto de Camille) e Amma (meia-irmã de Camille) é uma peça e tanto. O pai de Camille desapareceu após engravidar Adora e, anos depois do nascimento de Camille, Adora teve Marian – que morreu no início da adolescência por problemas de saúde. Quando é obrigada a voltar a esse seio, Camille tem que voltar para tudo que se livrou 8 anos antes: uma mãe que a detesta, um padrasto submisso e uma meia-irmã que mal conhece, mas que acaba se revelando quase uma versão dela mesma num século diferente. Adora é dona da empresa de carnes suínas de Wind Gap e, por isso, bastante respeitada e conhecida por toda a cidade. Amma, também é bastante conhecida pela cidade, mas não por motivos bons.

A autora vai explorando ao longo dos capítulos as relações de Camille com cada uma dessas pessoas, principalmente Adora. Memórias, discussões, fofocas, tudo vai sendo revelado e, ao fechar o livro, podemos montar um panorama bastante completo do que a moça teve que viver tanto antes quanto agora. Por ser contado em primeira pessoa, a personalidade da família Crellin nos é apresentada através dos boatos dos windegapianos fervorosos, durante as entrevistas de Preacker, por isso, algumas coisinhas podem ser aumentadas e outras podem ser a pura verdade.

O segundo segmento, o das investigações, é apenas o plano de fundo da coisa toda. A protagonista roda, roda, roda e quase não sai do canto, mas como um thriller policial, temos aquele capítulo dedicado apenas à explicação de tudo, todas as pontas sendo amarradas. O que mais pecou aqui, apesar do livro não ser do gênero policial, é o fato da autora ficar repetindo algumas vezes as mesmas coisas só que por diferentes personagens. As entrevistas de Preacker também servem para a personagem se recordar do seu passado, sua infância e sua adolescência.

Falando em adolescência, alguns de nós temos que concordar que já fizemos coisas que não são de se orgulhar, certo? Principalmente quem é de cidade pequena e tem aquele espírito rebelde. Com Camille não foi diferente. Quem já leu e lembra de Garota Exemplar, a autora nos dá pinceladas de discursos feministas nos capítulos de Amy Dunne. Aqui não é diferente, e é abertamente mostrado em alguns momentos da obra. Há uma cena em que Camille está numa reunião só de mulheres com suas antigas amigas do colégio e o tema é justamente esse: mulher e o poder feminino. Tento não tomar parte de atos ou discussões feministas, mas essa cena está entre uma das mais irritantes do livro. Enfim, Camille foi uma moça bastante voluptuosa no tempo de escola com suas amigas, experimentando de tudo, por isso fica chocada com as coisas que Amma faz. Gente, essas meninas fizeram coisas com 13 anos que eu nem fiz com 17. É impressionante!
— Oi, Camille, ouvi dizer que estava na cidade.
Eu não queria ouvir essa frase nunca mais.
Camille é recepcionada em Wind Gap de diferentes formas. Ter se mudado da cidade para uma cidade grande, ter se tornado repórter, não ter seguido os costumes da sua cidade natal e ainda voltar para ela xeretando um assunto tão delicado quanto o da sua reportagem, a fez ser mal vista por muitas pessoas, mas o seu tempo de adolescente não é esquecido por alguns, o que a faz ser bem tratada por vários locais.

Logo depois da morte de sua irmã Marian, Camille desenvolveu o ato de se cortar... E ela fazia isso com todo o tipo de objeto que tivesse uma ponta cortante o suficiente para riscar a carne. O problema é que Camille cortava palavras e aqui você deve fazer um exercício de inglês quando estiver lendo os nomes cortados. Sempre que puder, traduza-os para a língua original para você ter uma ideia mais sufocante do que a garota fazia. Ela fez cortes em todos os cantos do corpo: joelhos, debaixo dos seios, pelves, quadril, nádegas, braços, pé, enfim. Ela diz que passou por uma fase de palavras grandes e são palavras de 6 letras para cima. Caramba, batom em inglês é lipstick. É muito agoniante!

Agoniante também é a maldade cometida com as garotas, a maldade de Amma, a maldade de Adora. São cenas que você fica revoltado e foi isso que me fez dar uma estrela à mais para o livro: a espetacular construção dos personagens. Gillian soube criar seus personagens e soube aproveitá-los e extrair deles o máximo que pôde ao longo dessas quase 300 páginas.

Como romance de estreia, é notável que a escrita, crítica e crua da autora, só evoluiu de um livro para o outro, sempre pondo as mulheres como foco principal (em Objetos Cortantes, pode-se contar nos dedos de uma mão o número de personagens masculinos), mulheres fortes, psicóticas, mulheres perigosas. Objetos Cortantes é obscuro, enraivecedor e bem mais profundo do que eu posso descrever, mas infelizmente não é um livro preferido meu. 

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