20 de fevereiro de 2015

Menino de Ouro - Abigail Tarttelin

Autora: Abigail Tarttelin
Editora: Globo Livros
Gênero: Drama/New-Adult
Número de Páginas: 384 páginas
Número de Estrelas: 4 estrelas
Skoob: Menino de Ouro
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A família de Max não permitiria nenhum desvio na imagem perfeita que havia construído. Karen, a mãe, é uma advogada renomada, determinada a manter a fachada de boa mãe, esposa e profissional. Steve, o pai, é o exemplo do chefe de família presente em sua comunidade, favorito a um importante cargo público. O ponto fora da curva é Daniel, o caçula, que, para os padrões da família Walker, é “estranho”: não é carinhoso, inteligente ou perfeito como Max. Melhor aluno da escola, capitão do time de futebol, atlético, simpático, sucesso entre as garotas: Max, o primogênito, é o menino de ouro. Ninguém poderia dizer que sua vida não é perfeitamente normal. Ninguém poderia dizer que Max esconde um segredo.

O assunto que é tratado no livro e que do qual irei falar um pouco agora não é um spoiler, pois é revelado logo nas primeiras páginas. Mas caso você não queira saber, talvez seja melhor pular um ou dois parágrafos.


O que realmente sabemos sobre o hermafroditismo é algo bem básico. Minhocas são hermafroditas, mas isso é algo que aprendemos na escola. Algo simples, sem muito aprofundamento. Há pessoas hermafroditas... Intersexuais, agora chamados. Algo entre os dois sexos: masculino e feminino. Nem um nem outro, nem os dois nem só um. Nem tudo nem nada. Uma confusão, uma mistura. Um distúrbio, como os médicos chamam. O hermafroditismo é muito além dos boatos de que Lady Gaga tinha/tem um pênis, é muito além da constituição física dos anelídeos, é muito além das estatísticas que surpreendem o quanto isso é comum. Mas se um hermafrodita não é nem um nem outro, ele é homem e/ou mulher? Como saber se eu estou diante de uma pessoa de gênero masculino ou de gênero feminino? Ah, sem falar das cirurgias apressadas, incompetentes.

O hermafroditismo é isso e é muito além. É confuso para quem vê de fora e um caos para quem o vive todo dia. Casos de pessoas que fizeram a cirurgia de mudança de sexo, pois pareciam mais um menino, mas na verdade se sentiam como meninas, ou vice-versa. Erros médicos que acabaram mutilando a genitália ambígua do paciente e agora ele não é nem um nem outro. O que nos torna homem e o que nos torna mulher? É apenas o peso de um pênis ou a delicadeza de uma vagina? Será que é tudo tão preto no branco? Será que o nosso gênero está intrinsicamente ligado à nossa identidade? Como será que uma confusão como esta atinge diretamente a vida de uma família comum, de um garoto perfeito e de pais importantes?
Fazer parte da minha família é algo que vem com certa pressão.
Sendo escrito em primeira pessoa e contado pelo ponto de vista da família Walker e de mais duas pessoas de fora, o romance de Abigail Tarttelin aborda como o diferente muda o normal. A família Walker é, aparentemente, perfeita. Tem segurança financeira, uma casa grande e confortável, moram num bairro bom, numa cidade boa. Seus filhos estudam em escolas boas. São uma família invejável... por fora. Mas como ela é por dentro? Toda perfeita? Muito pelo contrário. Ao acontecer um fato X logo no terceiro capítulo do livro, a família começa a se deteriorar de dentro pra fora. A confusão se alastra na cabeça dos personagens de diferentes modos e isso vai sendo bem representado pela autora no decorrer dos capítulos. São reflexões de todos os gêneros: sobre sexualidade, sobre identidade, sobre amizade, sobre família, filhos, etc.

Ao tratar muito sobre as aparências, Abigail nos mostra que nem tudo que exibimos para o público é o mesmo que acontece nos bastidores. A autora vai tratando de assuntos muito importantes e já mencionados acima de maneira séria e científica – em momentos -, mas ao mesmo tempo, não deixa de brincar com cada coisa, nos fazer rir até mesmo nos momentos difíceis, nos fazer sorrir, nos mostrar a vida como ela é: os perigos, os problemas, as felicidades e de onde podem vir os conselhos mais inteligentes e mais reconfortantes.

Daniel, o filho fora do padrão é, para mim, o personagem mais chato de toda a história. Não sei. Eu tenho um problema com crianças e a personalidade de Daniel me incomodou bastante, me deu bastante raiva em algumas cenas, mas eu não sou cego a ponto de não encontrar e entender a lógica por trás de seus atos. Imaginem viver à sombra de um irmão mais velho perfeito, sem falhas e que não comete erros.
Eu o observo. Max Walker, menino de ouro, inteligente, sexy, engraçado, doce, sorridente, solidário, legal, popular, gentil, divertido, ótimo namorado, beijo muito bem, uma pessoa estranha com um segredo. Um esquisitão intrínseco, que não dava mesmo para saber.
A autora, porém, em alguns momentos parece rodar, rodar e não sair do canto. Claro, temos que levar em conta que muitos capítulos são reflexões dos personagens, em outros acontecem coisas importantíssimas (que servem para impulsionar a história), mas mesmo assim há capítulos bem cansativos e que não mostram quase nada.

A autora teve um bom controle sobre seus personagens, fazendo com que cada um tivesse personalidades próprias, verossímeis e que, por trás de cada pensamento, tivesse uma linha lógica e bem compreensível.

Menino de Ouro é mais do que uma ficção que trata sobre o hermafroditismo e as dificuldades das pessoas lidando com isso. É um livro que traz reflexões sobre quem e o que somos. É um livro que choca, mas que conforta na mesma medida e que nos faz buscar, dentro de nós mesmo, o que faz sermos quem somos. 

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